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27/07/2018 18h05

Jogos da CPLP

Com cooperação brasileira, capoeira retorna à África e expande suas raízes

Criada no Brasil, mas germinada do outro lado do Atlântico, a arte marcial ajuda a dar um futuro melhor para crianças de São Tomé e Príncipe. Projeto do Brasil deixou legado de cultura, esporte e cidadania para o país

Um projeto brasileiro mudou a vida de centenas de crianças do outro lado do Oceano Atlântico. Um pequeno país insular tem centenas de pequenos aficionados por uma expressão cultural que une esporte, arte marcial e música: a capoeira. O sons dos berimbaus são ouvidos em mais de 13 academias nas duas ilhas principais de um país de apenas 200 mil habitantes.

Roda de capoeira no Liceu Nacional, em São Tomé: formação de professores, atletas e cidadãos. Foto: Abelardo Mendes Jr/ rededoesporte.gov.br

Em 2010, um convênio entre a agência de cooperação do governo brasileiro e a Associação Raízes do Brasil, com base em Brasília, levou ao país africano um grupo de mestres para ensinar a centenária arte marcial germinada na África, mas criada por escravos no Brasil Colonial. Inicialmente, a cooperação duraria um ano e o sucesso fez com que a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) levasse adiante por mais cinco anos.

Atualmente, a adesão é tanta que apenas o futebol atrai mais pequenos praticantes de atividades físicas em São Tomé e Príncipe. O motivo é que, além do corpo, a capoeira ajuda a fortalecer a mente de cada indivíduo e a sociedade do país como um todo. Maykel Ribeiro Furtado, conhecido no mundo da capoeira como Vento, é o exemplo concreto dos resultados. Graduou-se com orgulho pelo Raízes do Brasil e hoje dá aulas pelo país, além de presidir a Federação de Capoeira de São Tomé.

"Para além da importância da prática da capoeira, trata-se de uma herança que o Brasil deixa em São Tomé e Príncipe de respeito à cidadania e de valores que essa prática desportiva leva à vida desses jovens"

Carlos Gonçalves, técnico de Cooperação da CPLP

"O projeto conseguiu demonstrar a riqueza da capoeira, como esporte e cultura e, também, como ela pode trabalhar como ferramenta de cidadania", afirma o idealizador do intercâmbio e fundador do Raízes do Brasil, Ralil Nassif Salomão, que fez várias viagens ao país para ensinar e acompanhar de perto o desenvolvimento da modalidade.

A capoeira já existia no país. "Antes, nós não estávamos habilitados, não tínhamos as técnicas ideais, não sabíamos os conteúdos. Nossa capoeira não era rica. Por meio desse projeto, já estamos em um patamar muito melhor. Até o Ministério da Juventude e do Desporto de São Tomé já nos apoia", explica Vento.

A filosofia do mentor é corroborada pelo discípulo. "Aqui nós trabalhamos não apenas a capoeira, mas para formar o cidadão. Foi importante demais ensinarmos aos jovens o respeito, a educação, a higiene e a igualdade de gênero, até para as meninas interagirem mais. E assim o as crianças aprendem não apenas na área da capoeira, mas como agir na vida e em outros esportes também", finaliza Vento.

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Maykel Furtado, o professor Vento, fez da capoeira a sua profissão e ensina centenas de crianças em São Tomé, capital do país africano. Foto: Abelardo Mendes Jr/ rededoesporte.gov.br

"Esse projeto deixou uma marca e um legado no país. Para além da importância da prática da capoeira, trata-se de uma herança que o Brasil deixa em São Tomé e Príncipe de respeito à cidadania e de valores que essa prática desportiva leva à vida desses jovens. Eles encontravam-se em situações muito frágeis e não tinham uma grande auto-estima", afirma Carlos Gonçalves, técnico de cooperação da CPLP responsável pelo projeto. "A capoeira transformou e continua a transformar a vida em São Tomé. Até mesmo o fato de continuar, de se perpetuar e não se perder o projeto, é uma experiência importante e notável para a população".

A vinda dos brasileiros gerou, também, uma visão de que o intercâmbio é importante para o desenvolvimento da arte no país. "Temos sempre contato com mestres do Brasil. No próximo mês, virão alguns para passar 15 dias aqui no país. Ficarão dez dias aqui na Ilha de São Tomé e cinco na Ilha do Príncipe. Estamos sempre em contato, também, com grupos de Angola e Portugal, pela internet", acrescenta Vento.

O exemplo sãotomense pode expandir ainda mais os horizontes da modalidade em países lusófonos. "Desta vez, há interesse de Guiné Bissau, Angola e Cabo Verde. O que vai diferenciar o novo projeto de Guiné Bissau do de São Tomé e Príncipe é que enviaremos mestres do Brasil para fazerem prospecção, pois é preciso ajustar os tipos de atividades específicas e entender bem a cultura local. Depois, pretendemos que professores formados por nós em São Tomé participem e ensinem em Guiné Bissau", finaliza Ralil.

Foto: Abelardo Mendes Jr/ rededoesporte.gov.br

Jogos da CPLP

Até o dia 28 de julho, São Tomé e Príncipe recebe delegações dos nove países lusófonos do planeta para os Jogos da CPLP, com competições sub-17 de atletismo, basquete 3x3, futebol, taekwondo e vôlei de praia. Este é o primeiro evento multiesportivo organizado pelo país africano em sua história.

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Saiba mais: São Tomé e Príncipe

 

As ilhas de São Tomé e Príncipe foram descobertas, ainda desabitadas, por navegadores portugueses em 1470. Localizado no Golfo da Guiné, na costa oeste da África sub-saariana, é formado por duas ilhas principais (Ilha de São Tomé e Ilha do Príncipe) e ilhotas, com população de pouco mais de 200 mil habitantes. Está próximo às costas do Gabão, Guiné Equatorial, Camarões e Nigéria. A linha do Equador passa em seu território: há um marco no Ilhéu das Rolas, um local de praias paradisíacas. 

Do século XV à década de 1970, foi uma colônia portuguesa. A independência ocorreu em 12 de julho de 1975. As principais atividades econômicas estão ligadas à agricultura e à pesca. Embora com um potencial turístico evidenciado por praias de águas cristalinas e temperatura agradável, o país ainda carece de infraestrutura para aumentar a quantidade de visitantes.

Fotos: Abelardo Mendes Jr/ rededoesporte.gov.br


Abelardo Mendes Jr, de São Tomé, em São Tomé e Príncipe - rededoesporte.gov.br